Notícia

Chapitô Colectividade Cultural e Recreativa de Santa Catarina

Agenda online Junho 2020

VAMOS LÁ DESCONFINAR A INTELIGÊNCIA!

A última edição da Agenda online do Chapitô, inspirada no Santo António, já está disponível! E nada melhor do que começar com o editorial da nossa Presidente, Teresa Ricou.

Versão completa da Agenda AQUI

“Estamos em plenas Festas Juninas, festas teluricamente associadas ao Solstício de Verão no hemisfério norte, e ao solstício de Inverno no hemisfério sul.

Finalmente soube bem apanhar um pouco de ar. Sair comedidamente e pôr a conversa em dia, ouvir uma música, espairecer, depois de um dia de trabalho. Sendo festas solares que se perdem nos confins dos tempos, convocam-nos para a coragem e para a morte do medo. Por isso o fogo, o saltar a fogueira, o riso, a alegria e a luz (nesta Lisboa, no encontro humano), partilhar a mesa e sentirmo-nos comuns cidadãos solidários.

Neste tempo conturbado em que o politicamente correcto parece ser o único normal, eu (que nunca fui uma mulher alinhada a não ser com os meus princípios) sinto, com toda a determinação e cada vez mais, uma imperiosa necessidade de preocupação com o outro. Bem precisamos deste “desconfinamento”, como agora o vírus maldito nos ensinou a dizer. Mas desconfinar não pode ser o “tudo ao molho e fé em Deus”, porque os deuses estão atarefados com tanta injustiça que as suas criaturas teimam em fazer perdurar e não têm vagar nem paciência para remediar as asneiras que fazemos.

Este ano não houve arraiais nem festejos de Santo António, mas muitos bairros continuaram a cantar das mais diversas formas e por isso Lisboa não morreu, antes continua expectante no ressurgimento do seu pulsar activo que agora a pandemia confinou. Como o nosso Cardeal-Poeta José Tolentino Mendonça nos ensinou na sua comunicação no 10 de Junho, e aí invocando Camões, precisamos de desconfinar a linguagem, que é como quem diz desconfinar a inteligência. E a arte e a cultura aqui estão na linha da frente – assim tenhamos o olhar atento que a nossa contemporaneidade exige e que alguns políticos de desatentos teimam em não perceber.

É urgente e imperioso que retomemos o hábito de comprar livros, de ir aos teatros e aos espectáculos circenses, de visitar museus e exposições, porque as artes são um factor de inclusão social.

A LINGUAGEM DA AFEIÇÃO.

Santo António, de seu nome Fernando de Bolhões, é de Lisboa por nascimento, de Pádua por último destino, do mundo por afeição. Numa vida terrena muito curta (faleceu com apenas 36 anos) como é que o frade franciscano se transformou numa referência popular que não conhece fronteiras físicas nem temporais? Diz a tradição que quando falava até os peixes o escutavam e mesmo os doutores da Igreja se curvavam perante tanta erudição.

E é o santo de todas as gentes e para todas as aflições!

É considerado padroeiro dos amputados, dos animais, dos estéreis, dos barqueiros, dos idosos, das grávidas, dos pescadores, agricultores, viajantes e marinheiros; dos cavalos e dos burros; dos pobres e dos oprimidos; é invocado para achar coisas perdidas, para conceber filhos, para evitar naufrágios e para conseguir casamento. Que mistério tinha a linguagem do santo para ser compreendido assim por um leque tão grande e diferenciado de seres viventes? Pois parece que o segredo era as palavras nascerem do coração – falava a linguagem da AFEIÇÃO com o conhecimento da realidade do dia-a-dia.

Pois então há-de Santo António ser também refúgio das Artes e dos Artistas, que fazem de mil linguagens alavancas para melhorar o mundo. E sonhamos um arraial sem fim, onde nas mesas cabem todos e todos se saciam da fome e da sede de cultura.

MUDAM OS VALORES E REESCREVE-SE A HISTÓRIA

Numa nesga do tempo alguém quis tornar imutável uma pessoa, uma ideia, uma obra, esquecendo que a vida é feita de mudança, só mudança. E fizeram uma estátua. Ali e aqui as edificaram. Ocupam o espaço público quase sempre ignoradas ou banalizadas pelo frenesim dos quotidianos. E de repente, noutra nesga de tempo, o que foi certo deixa de ser. E as estátuas não podem fugir.

Prisioneiras de pedestais que já não são, ícones de valores que já não queremos, as estátuas ficam à “mão de semear” de justiceiros do agora, esquecendo que a história é um continuum feita de ontem, de hoje e de amanhã.

Invocando o filme Fahrenheit 451 de François Truffaut, quase assistimos a uma espécie de invasão das bibliotecas e das livrarias e à ordem para lhes pegar fogo!...O mesmo fogo que incendeia florestas e tantas outras barbaridades dos humanos que parecem ter a finalidade de acabar com a herança e a história da humanidade… mas os vindouros têm o direito e a obrigação de as conhecer. Não há mundos ideais, a sabedoria é conviver no meio de tanta turbulência e, a todo o custo, não perder o sentido de justiça.

Com todo o respeito e reverência pela cor da pele, raça, etnia, género (pois que há gente boa e gente menos boa em todas as origens) a Liberdade tem que ser um valor único e para todos - esse o direito inalienável que convoco sempre.

Ah!... assim pudéssemos atirar ao mar e pinchar as “estátuas” (rígidas, duras, pesadas, permanentes) que vivem nos nossos corações e nas nossas mentes. Como o racismo, a homofobia, a ignorância…

Por aqui, no Chapitô, preparam-se os exercícios finais de ano, com o mesmo entusiasmo de sempre. É grande a azáfama, aumentada com a conjugação das restrições do momento. Entre o ensino à distância e os treinos dos alunos ao vivo, nos diferentes espaços do Chapitô – em pequenos grupos e todos artilhados (máscaras, luvas, desinfectantes, etc…) a vida continua! Os nossos compromissos sociais não precisam de decretos mas sim de uma responsabilidade social consciente, prevenindo qualquer contágio viral, solidários uns com os outros, íntegros connosco próprios - o bom senso impera.

Boas Festas Juninas.

TERESA RICOU"