OUTROS TEMAS TRANSVERSAIS

Autor: Pedro Aragão Morais

OUTROS TEMAS TRANSVERSAIS

INTRODUÇÃO

A Pobreza é uma matéria inesgotável, de tal modo ampla e complexa que se pode confundir com a própria história de toda a civilização humana. Nesta medida, o presente referencial técnico não passa de um mero apanhado, incompleto, sobre o fenómeno multidimensional da Pobreza. Assim, neste último capítulo, ainda que superficialmente, identificam-se mais alguns outros temas a serem tomados em consideração, transversais a cada uma das dimensões da Pobreza tratadas nos capítulos precedentes.


T1. ENTIDADES DA ECONOMIA SOCIAL

Segundo a Conta Satélite da Economia Social 2013, edição do INE em 2016, são mais de 61 mil as entidades a operar no sector:


Este último segmento das Associações, amplamente maioritário, é composto por uma multiplicidade de micro organizações, nomeadamente:

·         Centros Sociais e Paroquiais e outras Instituições Religiosas (Cáritas; Irmandades)
·         Culturais, Recreativas e Desportivas (Grupos de Teatro; Clubes Desportivos; Centros Recreativos)
·         Da Educação (Creches; Jardins-de-Infância; Colégios; Associações de Estudantes e de Professores)
·         Da acção Social (Lares, Centros de Dia, outros)
·         De Desenvolvimento Comunitário e Local
·         Casas do Povo
·         Cruz Vermelha Portuguesa
·         Federações, Uniões e Sindicatos
·         Corporações de Bombeiros
·         Algumas Unidades de Saúde e Hospitais
·         Algumas Universidades, Politécnicos, Academias e Institutos
·         Bibliotecas e Museus
·         Outras associações diversas de solidariedade em geral (multi-serviços)
·         Outro associativismo diverso (ambiente, animais, causas humanitárias, escutismo, etc.)

As maiores, ou mais preponderantes, ‘famílias de instituições’ estão representadas junto do poder político por congregações, entre as quais:

·         CNIS - Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade
·         CASES - Cooperativa António Sérgio para a Economia Social
·         UMP - União das Misericórdias Portuguesas
·         União das Mutualidades Portuguesas
·         ANIMAR - Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Local
·         CPF - Centro Português de Fundações
·         RUTIS - Rede de Universidades da Terceira Idade

As 5.000 Instituições de Particulares de Solidariedade Social (IPSS) que asseguram 2/3 de toda a Acção Social realizada em Portugal, destacam-se pelo seu peso no sector (representam cerca de 50% do VAB total) e pelo seu estatuto especial perante o Estado, o qual lhes confere as prerrogactivas de Utilidade Pública e consequentes Benefícios Fiscais, bem como a capacidade de celebração de Acordos de Cooperação com a Segurança Social.

O panorama das IPSS é heterogéneo, na medida em que, por todo o país, há uma grande diversidade de tipos de organização que gozam do estatuto de IPSS, a maioria das quais de pequena dimensão (com menos de 50 colaboradores), entre algumas outras de dimensão mais significactiva (orçamentos anuais na ordem de vários milhões de euros), assumindo formas jurídicas distintas (sobretudo Centros Sociais e Paroquiais, Misericórdias e Associações, mas também Cooperactivas e algumas Fundações).

O Instituto da Segurança Social IP, que tutela a actividade das IPSS, regulamenta e fiscaliza o funcionamento das valências ou respostas sociais por estas instituições asseguradas às populações mais desfavorecidas ou carenciadas. Entre essas respostas sociais convencionadas pela Segurança Social e muitas outras enquadradas nos âmbitos da Educação, Saúde e Cultura, protocoladas com os respectivos ministérios, a lista de valências possíveis de encontrar em IPSS é extensa, quase infindável dada a anarquia reinante em termos da nomenclatura utilizada:

·         Acolhimento Familiar
·         Acolhimento Permanente
·         Acolhimento Temporário
·         Amas Famílias
·         Ambulatório
·         Apartamento de Autonomização
·         Apoio Domiciliário
·         Atendimento Social e Psicológico
·         Actividades Culturais
·         Actividades Ocupacionais
·         Biblioteca
·         Campo de Férias
·         Casa de Abrigo
·         Centro Apoio à Vida
·         Centro ATL
·         Centro Comunitário
·         Centro Convívio
·         Centro de Atendimento
·         Centro de Dia/Noite
·         Centro de Formação
·         Centro de Investigação
·         Centro de Medicina e Reabilitação
·         Centro de Recursos
·         Centro Terapêutico
·         Clínica
·         Colónia de Férias
·         Creche
·         Cuidados Continuados de Saúde
·         Distribuição Alimentar
·         Educação Especial
·         Emprego Protegido
·         Empresa de Inserção
·         Equipa de Intervenção Directa
·         Equipas de Rua
·         Escola de Pais
·         Escola do Ensino Básico
·         Formação Profissional
·         Fórum Socio-Ocupacional
·         Grupo Auto-Ajuda
·         Hidroterapia
·         Hipoterapia
·         Inserção Profissional
·         Intervenção Precoce
·         Jardim de Infância
·         Lar Crianças em Risco
·         Lar de Idosos
·         Lar Residencial
·         Museu
·         Prática Desportiva
·         Pré-escolar
·         Quinta Pedagógica
·         Refeitório Escolar
·         Refeitório Social
·         Residência
·         Serviço Tele-Alarme
·         Transporte de Pessoas
·         Unidade de Apoio Integrado
·         Unidade de Vida Protegida
·         Unidade Móvel de Saúde
·         Universidade Sénior

A Rede Social, cuja gestão é da competência do Instituto da Segurança Social I.P., é um programa que incentiva os organismos do sector público (serviços desconcentrados e autarquias locais), instituições solidárias e outras entidades que trabalham na área da acção social, a conjugarem os seus esforços para prevenir, atenuar ou erradicar situações de pobreza e exclusão e promover o desenvolvimento social local através de um trabalho em parceria. O trabalho da Rede Social deve permitir uma maior adequação e melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos de um modo geral e, particularmente, àqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade. O que se propõe é que, em cada comunidade, as autarquias e as entidades públicas e privadas: (1) Tenham uma visão partilhada dos problemas sociais que existem nessa área; (2) Definam em conjunto objectivos, prioridades, estratégias e acções; (3) Utilizem de forma mais racional os recursos disponíveis. A Rede Social tem plataformas de planeamento e coordenação da intervenção social a nível das freguesias e dos concelhos (Conselhos Locais de Acção Social - CLAS). A um nível regional mais abrangente, operam as plataformas territoriais supraconcelhias nas 28 regiões NUT III. Em traços gerais procura-se construir um retrato comum da situação social concelhia, resultante dos contributos das várias entidades com intervenção na área do concelho que permita identificar prioridades de intervenção. Este retrato servirá de base para a construção de um Plano de Desenvolvimento Social (PDS) em que estejam inscritos os objectivos e estratégias de intervenção definidos para um quadro temporal alargado (cerca de três anos) e sejam planeadas as formas de operacionalização do PDS tendo em linha de conta um horizonte temporal mais curto (planos de acção anuais).


T2. INDICADORES DE POBREZA

Na mais recente edição do INE sobre o Rendimentos e Condições de Vida dos portugueses em 2015, destacam-se os seguintes indicadores:

·         19,0% das pessoas, residentes em Portugal, estavam em risco de pobreza em 2015, valor inferior ao observado no ano anterior (19,5%).

·         A taxa de risco de pobreza correspondia, em 2015, à proporção de habitantes com rendimentos monetários líquidos (por adulto equivalente) inferiores a 5 268 euros anuais (439 euros por mês).

·         Em 2015, os riscos de pobreza mais elevados continuavam a registar-se nas famílias com dois adultos e três ou mais crianças dependentes (42,7%).

·         O risco de pobreza afetava, sobretudo, os seguintes grupos populacionais: 22,4% da população com menos de 18 anos; 18,3% da população idosa; 42,0% da população desempregada;

·         Sem quaisquer transferências sociais, 46,3% da população residente em Portugal estaria em risco de pobreza e após pensões seria 25,5%.


T3. SUSTENTABILIDADE DAS IPSS

A lógica de funcionamento da esmagadora maioria das IPSS assenta no modelo assistencialista do Estado, hoje de futuro incerto ou periclitante. Porém, a inerente condição de Utilidade Pública é plenamente justificada por muitas destas IPSS, seja por ausência de qualquer alternativa efectiva ao serviço que prestam às comunidades onde se inserem, seja porque a qualidade desses seus serviços é, de facto, comprovadamente vantajosa.

Os Acordos de Cooperação estabelecidos com o Estado que se destinam a subsidiar custos de funcionamento das IPSS, não financiam investimento, pelo que se estima cobrirem, em média, não mais de 70% dos custos totais de exploração nessas instituições. Como receita segura, para além desse subsídio da Segurança Social, as instituições contam ainda com as comparticipações dos utentes, cujo valor é calculado em função do rendimento per capita líquido do respectivo agregado familiar. Normalmente esta parcela tende a representar pouco mais de 10% do orçamento total da instituição. Nestes termos, podemos concluir que, em média, cerca de 20% das receitas necessárias para cobrir os custos totais das IPSS são de natureza incerta, não estando à partida asseguradas, pois não decorrem directamente de proveitos da sua actividade regular.

Conforme vem explícito no estudo “As Instituições Particulares de Solidariedade Social num contexto de crise económica” Sónia Sousa - IPI Consulting Network Portugal - CNIS e Millennium BCP (2012), está ainda muito enraizada nas mentalidades de muitas IPSS que as soluções passam quase sempre e fundamentalmente pelo reforço dos apoios financeiros públicos. Ora, a escassez de recursos públicos actuais e previsíveis para os anos vindouros torna esta visão cada vez mais irrealista. O grande desafio à actuação das IPSS é, pois, continuarem a responder às necessidades sociais, antigas e novas, mas a partir de uma base de apoios financeiros mais diversificada onde os apoios públicos são uma entre várias outras fontes de financiamento. Os apoios públicos continuarão a ter necessariamente um papel importante na estrutura de financiamento das IPSS, mas estes não podem continuar a ser encarados como a fonte primeira e em muitos casos quase exclusiva de recursos financeiros. Esta análise evidencia a significativa fragilidade 80 OUTROS TEMAS TRANSVERSAIS Referencial Técnico COMBATE À POBREZA E EXCLUSÃO SOCIAL do modelo de financiamento das IPSS, até agora fortemente dependentes das transferências públicas. As restrições nas despesas públicas previstas para os anos mais próximos tornam o actual modelo de financiamento insustentável a prazo e impõem às IPSS e à sociedade em geral o desafio de encontrarem modelos alternativos de sustentação económico-financeira deste sector de vital importância económica e social.


T4. VOLUNTARIADO

Também segundo a Conta Satélite da Economia Social (INE), em 2012, 11,5% da população residente participou em pelo menos uma actividade de trabalho voluntário, o que representou quase 1 milhão e 40 mil voluntários. Nas organizações da Economia Social, o trabalho voluntário equivale a um acréscimo de 41,8% da sua força laboral total. No entanto, Portugal é dos países com mais baixa taxa de voluntariado na UE27, cuja média é de 24%.

O voluntariado especializado deve ser o caminho a seguir pelas IPSS para obtenção de apoio técnico de gestão. O voluntariado especializado permite suprir necessidades de pessoal altamente qualificado e especializado que as IPSS precisam apenas em tempo parcial e que mesmo assim dificilmente conseguem custear. Em contrapartida, é relativamente fácil encontrar na generalidade das comunidades locais profissionais qualificados e experientes em quase todas estas valências, sejam profissionais no activo, sejam profissionais reformados. O desafio que se coloca às IPSS é o de serem capazes de mobilizar estes profissionais para colaborarem com elas na resposta às necessidades que afectam a comunidade em que se inserem.

Em Portugal, ainda são poucas as entidades do terceiro sector que integram na sua estrutura organizacional a função voluntariado de modo profissional, gerindo-a de forma sistemática e efectiva. São quase exepções que confirmam a regra, os notáveis exemplos da Entrajuda, do Banco Alimentar ou da Refood, da Comunidade Vida e Paz ou da Acreditar, e ainda de Instituições Religiosas como seja o caso do Centro Social e Paroquial do Campo Grande em Lisboa. De resto, a grande maioria das instituições sociais recorre ao voluntariado com carácter meramente pontual e informal, sem dispor de um corpo organizado e permanente de colaboradores voluntários. A mais imediata explicação para esta lacuna estrutural do sector reside na constatação de que a gestão profissional do voluntariado, é uma tarefa difícil de sustentar de modo continuado no tempo, que exige desenvolvimento de competências próprias, para as quais muitas instituições ainda não despertaram ou não têm condições de assegurar sozinhas. Trata-se aqui, portanto, de um campo fértil para a capacitação. E, nestas circunstâncias, o potencial da modalidade de voluntariado corporativo, baseado em fortes parcerias entre as instituições sociais e as empresas, deveria ser melhor aproveitado. Uma outra questão relevante, complexa e sensível, prende-se com 81 OUTROS TEMAS TRANSVERSAIS Referencial Técnico COMBATE À POBREZA E EXCLUSÃO SOCIAL o modo como as entidades reflectem nas suas contas a contribuições em espécie decorrentes do voluntariado, cuja contabilização não pode deixar de basear-se em critérios do maior rigor e transparência.


T5. PARCERIAS

 Em todos os segmentos alvo deste combate à pobreza e exclusão social, ressalta, como denominador comum, o imperativo das parcerias estabelecidas entre diferentes agentes económicos, públicos e privados, nacionais e locais (acrescente-se aqui, com e sem fins lucrativos), numa conjugação de esforços em que cada qual, emprestando suas competências, acrescenta valor à articulada prossecução das intervenções em causa. A título de exemplo, algumas boas práticas:

Projecto: Justiça Para Todos
Promotor: IPAV - Instituto Padre António Vieira
Parceiros:
·         Alto Comissariado para a Emigração e Diálogo Intercultural
·        Centro de Estudos Judiciários e Direitos Humanos - Centro de Investigação Interdisciplinar da Universidade do Minho
·         Vários Estabelecimentos de Ensino Básico e Secundário

Valor Acrescentado: Facilitação de recursos, envolvimento e apoio na construção de uma rede para a educação sobre a Justiça e os Direitos Humanos

Projecto: Orquestra Geração
Promotor: Conservatório Nacional
Parceiros:
·         Câmara Municipal da Amadora
·         Fundação Calouste Gulbenkian
·         Agrupamento de Escolas Miguel Torga 

Valor Acrescentado: Cofinanciamento; facilitação de meios; acolhimento dos beneficiários directos.

Projecto: Escolinha de Rugby da Galiza
Promotor: Misericórdia de Cascais
Parceiros:
·         Câmara Municipal de Cascais
·         Fundação EDP
·         Federação Portuguesa de Rugby
·         Agrupamento Escolas S. João Estoril

Valor Acrescentado: Cofinanciamento; facilitação de meios; participação organizativa e dinamizadora

Projecto: MAIS - Melhor Ação e Inovação Social
 Promotor: UDIPSS-PORTO
 Parceiros:
·         TESE
·         Católica Porto Business School
·         AEGE
·         ACCENTURE, Consultores de gestão, S.A

Valor Acrescentado: Voluntariado de competências; capacitação pro bono em áreas de alta direcção, como estratégia, planeamento e controlo de gestão.

Entre os projectos distinguidos pelo Prémio BPI Solidário, uma das mais importantes iniciativas realizadas por empresas privadas no âmbito do combate à pobreza e exclusão social em Portugal, também figuram vários casos notáveis de intervenções com predominante recurso às parcerias, como por exemplo:

·         Projecto “Horta solidária em prisões” da Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares Contra a Fome

·        
Projecto “Alargamento da rede Re-food” da Associação Re-Food 4 Good

·        
Projecto “Preparação para o mercado de trabalho” da CAIS - Associação de Solidariedade Social

·        
Projecto “Mudar de vida” da Comunidade Vida e Paz

·        
Projecto “Prevenir reincidência criminal” do Chapitô - Colectividade Cultural e Recreativa de Sta Catarina


T6. INVESTIMENTO SOCIAL

Segundo a importante proposta “Uma Nova Abordagem para o Investimento na Sociedade”, da autoria do Grupo de Trabalho Português para o Investimento Social, o sector da Economia Social enfrenta desafios no seu financiamento, que ameaçam o seu progresso e impedem as entidades da Economia Social de atingirem o seu potencial de impacto. Os dados mais recentes da Conta Satélite para a Economia Social do INE e da CASES sugerem que as entidades da Economia Social têm necessidades líquidas de financiamento de 750 milhões de euros, por ano. A vulnerabilidade financeira limita o impacto das entidades e compromete a capacidade das mesmas realizarem a missão que têm. Em vez de se focarem em oferecer serviços de qualidade, utilizam uma parte significativa do seu tempo a angariar fundos. O financiamento que estas entidades recebem é quase sempre direccionado para projectos específicos – são muito poucos os casos em que o financiamento se destina a apoiar o desenvolvimento de competências das entidades apoiadas. Por exemplo, poucas entidades têm recursos para financiar o desenvolvimento dos seus negócios/ operações, para gerir ou avaliar o seu desempenho, ou para apostar na formação das suas equipas. Como resultado, as entidades da Economia Social não têm meios para se preparar para atingir a sustentabilidade no longo prazo.

O investimento social – aplicação de capital com o objectivo de gerar simultaneamente retorno social e financeiro – constitui uma alternativa para apoiar as entidades da Economia Social no acesso a financiamento adequado às suas necessidades e melhorar a sua capacidade de gerar impacto. O investimento social pode ser utilizado para financiar as operações de um determinado projecto, com financiamento inicial que cubra as necessidades de um contrato com base em resultados ou actividades; ou pode ser utilizado para ajudar as entidades a cumprirem a sua missão ao longo do tempo, apoiando o desenvolvimento das suas estratégias, modelo de negócio ou plano de expansão.

Neste âmbito, o Grupo de Trabalho Português para o Investimento Social deixa-nos cinco recomendações fundamentais:

1.       PROCURA: Fortalecer as competências das entidades da economia social, através de programas de capacitação.

2.        OFERTA: Introduzir instrumentos financeiros adequados às necessidades das entidades da economia social.

3.
   SECTOR PÚBLICO: Promover uma cultura de orientação para os resultados no seio dos serviços sociais públicos.

4.
       INTELIGÊNCIA DE MERCADO: Criar um centro de conhecimento e recursos para o investimento social.

5.
       INTERMEDIÁRIOS: Desenvolver um ecossistema de intermediários de investimento social

A estrutura de missão Portugal Inovação Social representa um marco importante na promoção do investimento social em Portugal. A sua missão é inovadora: dinamizar o ecossistema de inovação e empreendedorismo social e catalisar o mercado de investimento social. Mobilizando 150 milhões de euros provenientes de fundos estruturais europeus Portugal 2020, a estratégia desenhada para esta estrutura de missão assenta em quatro pilares que em conjunto pretendem: apoiar o crescimento da procura e estimular a oferta do mercado de investimento social; minorar a falta de financiamento para entidades da economia social, disponibilizando investimento social, capital de filantropia de impacto e promovendo o financiamento público com base em resultados; e, promover programas de capacitação e desenvolvimento de competências das entidades que desenvolvem iniciativas de inovação social. Cada um desses quatro pilares estratégicos consubstancia-se num instrumento em concreto:

(1) Capacitação para o Investimento Social que pretende apoiar Iniciativas de Empreendedorismo e Inovação Social (IIES) no reforço das suas capacidades organizativas e competências de gestão, com o objectivo de as tornar mais preparadas para gerar impacto social e captar investimento social;

(2) Parcerias para o Impacto de apoia IIES que queiram implementar um plano de desenvolvimento de 1 a 3 anos, para alcançarem maior escala e impacto;

(3) Títulos de Impacto Social que são mecanismos de financiamento que pressupõem a celebração de um contrato entre investidores sociais, entidades do setor público e entidades implementadoras, para concretizar resultados sociais específicos;

 (4) Fundo para a Inovação Social que funcionará como fundo grossista que, através de produtos de investimento social, co-investirá com fundos retalhistas em entidades da economia social que demonstrem ter potencial para gerar retornos sociais e financeiros.

Por último, intimamente ligado a esta disruptiva abordagem ao Investimento Social, impõe-se prestar a devida atenção à emergente questão da Avaliação de Impacto Social. O Impacto Social consiste nas mudanças que ocorrem na sociedade em consequência de determinada intervenção. Essas mudanças podem ser positivas ou negativas. A intervenção em causa pode consistir uma iniciativa isolada, um projecto em concreto, ou ainda a organização como um todo. Tanto quanto possível, o impacto deve ser traduzido em indicadores que se possam quantificar.

A Estratégia Europa 2020, por comparação com as subjacentes aos QCA’s precedentes, veio acentuar o imperativo da avaliação de resultados. O DL 159/2014 que define as regras gerais de aplicação dos programas operacionais financiados por fundos europeus, no seu art. 6º estabelece o ‘princípio geral de orientação para resultados’, segundo o qual toda a operação apoiada tem de assumir um claro compromisso de atingir determinados resultados, suportados em indicadores, não só qualitativos mas também quantitativos, os quais se encontram previstos nos regulamentos específicos de cada medida ou ação que compõem os diferentes programas operacionais.

Em Portugal, até há uma dúzia de anos atrás, a orientação para os resultados não constituía uma prioridade para a generalidade das entidades da economia social. Hoje, em consequência das preocupações em torno do Desenvolvimento Sustentável, há uma crescente pressão para que as organizações da economia social consigam comprovar o seu efectivo contributo no combate à pobreza e exclusão social. No entanto, ainda agora está quase tudo por fazer: não existe consenso sobre o que se entende por impacto social nem como avaliá-lo; não existe legislação que regulamente esta matéria nem entidades especializadas que assegurem sua fiscalização; da parte dos financiadores, não há o devido reconhecimento nem a imprescindível valorização de boas práticas de gestão de impacto nas organizações sociais. Estão a surgir, contudo, alguns importantes esforços neste âmbito:

·        
O GRAIS – Grupo de Reflexão para a Avaliação do Impacto Social, que se constituiu em 2013, composto por um conjunto de entidades representantes dos vários sectores da sociedade – empresas, fundações, universidades, organismos do estado e organizações da economia social – com o intuito de reflectir de forma participada sobre a problemática da avaliação de impacto social em Portugal. Em 2015, com vista a ajudar as empresas a adoptarem parâmetros de actuação que as habilitem a selecionar as melhores iniciativas, aquelas que apresentem melhores resultados e potencialidades de retorno e que permitam efectivar políticas de responsabilidade social consequentes, o GRAIS lançou um documento, designado Linhas de Orientação para Investidores e Financiadores Socialmente Responsáveis, o qual, em formato de regulamento, propõe um conjunto de normas em matéria de utilização de conceitos e princípios de actuação, a serem partilhados e prosseguidos por investidores e financiadores sociais. Esta importante proposta regulamentar, reserva um capítulo dedicado expressamente ao Impacto Social, definindo conceitos básicos, identificando os benefícios da avaliação de impacto e orientações fundamentais sobre a respetiva aplicação de metodologias e ferramentas;

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O Protocolo entre o Estado Português e a Fundação Gulbenkian que visa a colaboração o desenvolvimento de acções que potenciem o crescimento e a formação sobre inovação e investimento social, nomeadamente, (1) a criação de uma base de dados e plataforma de divulgação dos custos públicos gerados por problemas sociais, para se poder avaliar o impacto financeiro que os projectos de inovação social poderão ter na sua diminuição; (2) ações de capacitação de quadros da Administração Pública para o tema da inovação e investimento social, bem como promoção de orientações e boas práticas no sector público para o pagamento por resultados;

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O Programa Impacto Social, promovido pela CASES e pela Fundação Montepio, que tem como objectivo capacitar as entidades da economia social na avaliação de impacto das suas ações no terreno e que é composto por duas etapas, um ciclo inicial de webinars, através do qual são seleccionadas as entidades participantes na segunda fase de mentoria intensiva e workshops na especialidade;

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O Grupo Impacto Portugal que reúne alguns dos principais actores de todos os sectores em torno do apoio e desenvolvimento da agenda de impacto social em Portugal, tendo por objectivos, (1) aumentar o conhecimento sobre a avaliação de impacto social; (2) melhorar o conhecimento de metodologias e ferramentas de trabalho sobre a avaliação de impacto social entre os membros do grupo; (3) analisar casos de estudo nacionais e internacionais e fazer troca de boas práticas; (4) promover projectos nas organizações e projectos conjuntos de avaliação de impacto social; (5) potenciar o acesso a novas fontes e formas de financiamento. Deste Grupo de Impacto Portugal, que integra o movimento Social Value Internaional, já emanaram diversas iniciativas relevantes, como por exemplo, a versão em língua portuguesa do “Código de Boas Práticas de Impacto” do NCVO membro do Inspiring Impact ou o seminário “Conversas com Impacto” realizado em novembro de 2016 no Fórum Telecom em Lisboa. Entre os membros deste grupo plural, aberto a toda a comunidade, figuram representantes das mais diversas entidades, tais como, as Águas de Portugal, a ARCIL, a Call to Action, a CORE, a ESLIDER, a Fundação Calouste Gulbenkian, a Fundação EDP, o IES, o Laboratório de Investimento Social, a Logframe, a freelancer Mariana Branco, a OIKOS, a Operação Nariz Vermelho, a Sair da Casca, a Sector 3 – Social Brokers, o Social Data Lab, a Stone Soup Consulting, a TESE, entre outras.

 

 


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