SUSTENTABILIDADE E QUALIDADE DAS ORGANIZAÇÕES DO 3º SECTOR

Autor: Armando Torrinha

SUSTENTABILIDADE E QUALIDADE DAS ORGANIZAÇÕES DO 3º SECTOR

A importância da gestão da qualidade e de projetos na concretização deste desiderato.

As organizações do terceiro setor em Portugal têm uma força económica e social relevante, sendo constantemente desafiadas a contribuir para a operacionalização da função social do serviço público e para o bem comum.

As organizações do terceiro sector beneficiam não só de uma legitimidade social para a promoção da sua atividade, como acabam por ser um motor de estimulação económica de enorme relevância ao nível micro para a comunidade onde operam, e a nível macro para o país.

Pese embora uma avaliação positiva da sociedade relativamente ao papel das organizações do terceiro sector, verificamos que cada vez mais a gestão das organizações do terceiro sector têm sido desafiadas para incorporar na sua gestão de topo um planeamento estratégico, criando formas inovadoras para concretizar a sua “raison d’être” e promover, não só a sua sustentabilidade financeira, mas também a forma de encontrar novas soluções para os problemas das pessoas que apoia, numa abordagem holística e abrangente nas suas mais diversas dimensões de Qualidade de Vida (p.e. Desenvolvimento Pessoal e Social, Inclusão Social e Bem Estar) sistematizando as sua práticas de longos anos através de um mapeamento de processos e suas interações.

Assim as organizações, vêem-se em grande parte obrigadas a exigir de si próprias um sistema de gestão que se assemelha em grande parte à gestão empresarial privada, dada a dimensão que as mesmas atingem, quer em termos de gestão de recursos humanos, quer em termos de gestão financeira.

obrigadas a exigir de si próprias um sistema de gestão que se assemelha em grande parte à gestão empresarial privada

No entanto, esta gestão adaptada às organizações do terceiro setor, efémera de grandes perigos, tais como um maior foco na sustentabilidade económica e financeira que no aspeto humano e na qualidade de vida de quem apoia.

Devemos ter em consideração a ameaça com que os gestores destas organizações se deparam, para que valores básicos de sobrevivência não se sobreponham à premência da evolução, adaptação e resposta às questões de diversidade e inclusão social, bem como aos novos desafios com que atualmente nos deparamos.

valores básicos de sobrevivência não se sobreponham … às questões de diversidade e inclusão social

Na minha opinião, a adoção por parte das organizações de uma cultura da qualidade, e em concreto na incorporação de sistema(s) de gestão da qualidade, possibilita que todos os “stakeholders” tenham conhecimento dos resultados do desempenho organizacional, permitindo às organizações um papel de autorregulação da sua ação e por conseguinte do seu desempenho.

É de extrema importância as organizações não se limitarem aos processos de “accountability”, isto é, de não se cingirem à avaliação na vertente de criação de valor e impacto económico (financeiro), mas também na vertente de criação de valor e impacto social. A chave do sucesso é não dissociarmos estas duas vertentes, assegurando o equilíbrio entre ambas.

Os grandes desafios das organizações sociais centram-se, não unicamente na capacidade de implementar sistema(s) de gestão da qualidade, mas de incorporar de forma efetiva os seus princípios, alinhados com as suas práticas, sendo que os processos de gestão e o pensamento estratégico são a melhor ferramenta para um bom desempenho organizacional.

os processos de gestão e o pensamento estratégico são a melhor ferramenta para um bom desempenho organizacional

No caso da APCV – Associação de Paralisia Cerebral de Viseu, demonstrou desde a sua fundação que teve sempre no seu “ADN” uma vontade de sistematizar as suas práticas e de criar novas soluções e respostas para as pessoas que apoia e para a comunidade onde opera, tendo desde o primeiro momento implementado o sistema de gestão da qualidade, e desde 2009 tem vindo a sistematizar as suas práticas, simplificando processos e selecionando indicadores relevantes para avaliação do seu desempenho organizacional.

Tem atualmente vindo a adequar o seu sistema da qualidade ao EQUASS 2018, o qual se balizará pelo envolvimento de todos os “stakeholders”, no alinhamento com a nossa visão estratégica para estipular objetivos que permitam a melhoria contínua, sempre com especial enfoque na abordagem centrada na pessoa apoiada e suas famílias.

sempre com especial enfoque na abordagem centrada na pessoa apoiada e suas famílias

Tem vindo a incorporar, ao longo dos seus 38 anos de existência, abordagens inovadoras e contextualizadas a cada momento, que permitem a prossecução dos seus fins estatutários, mais concretamente a satisfação das necessidades e expetativas das pessoas e famílias que apoia e da comunidade envolvente.

Sendo o planeamento estratégico uma ferramenta para a desenvolvimento organizacional, a APCV– Associação de Paralisia Cerebral de Viseu considerou quatro eixos estratégicos ao nível da sua atuação presente e futura.

1. Sustentabilidade da Organização

Orientada para o desenvolvimento de uma governação coerente, para privilegiar as boas práticas, a inovação social, o planeamento e a melhoria contínua, utilizando todos os recursos de forma eficiente e comprometida com objetivos, metas e resultados ambiciosos.

2. Qualidade da Intervenção

Orientada para a promoção da qualidade de vida das pessoas que apoia, de acordo com as suas necessidades, expetativas e contexto, fomentando a participação, a defesa dos direitos, a multidisciplinariedade e a inclusão, como veículo para o desenvolvimento de um percurso individual ajustado e coerente.

3. Envolvimento com a Comunidade

Cooperar ativamente com parceiros na comunidade, maximizando sinergias de modo a promover o seu compromisso de responsabilidade social, a abrangência e continuidade dos serviços e para alcançar melhores resultados, garantindo a sustentabilidade organizacional e uma sociedade mais inclusiva.

4. Inovação e Desenvolvimento Organizacional

O desenvolvimento organizacional é a base que sustenta a melhoria contínua. A aposta na melhoria de competências e bem-estar dos colaboradores permite reforçar a orientação para inovação como estratégia promoção da sustentabilidade, eficácia e eficiência das nossas respostas e melhoria a satisfação das partes interessadas relevantes.

Assim, sou de opinião que as organizações devem, numa ótica de transparência e de comunicação de resultados, priorizar a implementação e incorporação de sistemas de gestão de qualidade, englobando o ciclo PDCA (Plan, Do, Check, Act) nos seus processos chave, gestão e suporte.

priorizar a implementação e incorporação de sistemas de gestão de qualidade

Também a adoção de uma gestão de projetos, quer sejam de melhoria ou de inovação, é de fulcral importância para o crescimento sustentável das organizações, com vista à concretização da sua missão, através do desenvolvimento de pequenos e grandes projetos de desenvolvimento social e comunitário.

A APCV – Associação de Paralisia Cerebral de Viseu, como as demais entidades congéneres, tem vindo ao longo dos anos a acompanhar as tendências na área de gestão de projetos com caráter de inovação social, tendo efetuado já um longo percurso neste campo, consolidando estratégias e permitindo de forma gradual e progressiva a contribuição para a mudança social das pessoas que apoia e mudança da comunidade local, com expressão direta e concreta a favor da inclusão das pessoas com deficiência e/ou incapacidade.

A promoção de projetos sociais contribui também para a dinamização das sinergias locais e o impacto do papel das organizações do terceiro setor, fomentando assim um papel de complementaridade e interdependência entre as diferentes dimensões da atividade económica local e as instituições existentes, através da consolidação de parcerias, com a consequentemente criação de valor.

gestão de projetos, quer sejam de melhoria ou de inovação, é de fulcral importância para o crescimento sustentável das organizações

Devemos nesta gestão de projetos, ter a preocupação de adotar os instrumentos que nos permitam a planificação por objetivos, análise, apreciação, acompanhamento e avaliação de projetos. O método que me refiro é o MQL, ou "Método de Quadro Lógico".

Gostaria, em especial, de referir que este método assenta na ideia de que um projeto de desenvolvimento só se justifica se os resultados corresponderem às necessidades das pessoas que o projeto pretende abranger.

Como último apontamento, gostaria ainda de referir que as organizações devem ter como condição sine qua non, uma política organizacional que lhes permita o envolvimento e participação das pessoas, associações e da comunidade no seu sistema(s) de gestão.

Por Armando Torrinha, Presidente da Direção da APCV – Associação de Paralisia Cerebral de Viseu

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