Carta aberta em tempo de Pandemia

Autor: Domingos Rosa

Carta aberta em tempo de Pandemia

No momento que escrevo este texto, a pedido do Sector 3, estamos TODOS a viver um período difícil nas nossas vidas, de dimensão Mundial, a Pandemia COVID-19, com um fim cheio de interrogações, mas com muita esperança.

Esta Pandemia terrível que afeta tudo e todos de igual forma, pessoas doentes e saudáveis, novos e velhos, empregados e desempregados, ricos e pobres, pessoas que professam qualquer religião, de todas as zonas do globo, com um elevado número de mortes e de pessoas infetadas/internadas, de rápida transmissão que nos deixa sem folego e, muitas vezes sem vontade de lutar, faz-nos interrogar sobre o papel de todos nós na sociedade e em que sociedade pretendemos viver.

Como tem sido amplamente divulgado, o setor social foi uma das instâncias mais afetadas com a Pandemia, salientando que, pelo menos, 1/3 das pessoas falecidas na Europa são utentes residentes em ERPI´s – Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas.


Esta Pandemia terrível que afeta tudo e todos de igual forma … faz-nos interrogar sobre o papel de todos nós na sociedade e em que sociedade pretendemos viver.


Apesar de sabermos que a morte de pessoas incide sempre e naturalmente na população mais idosa, e de termos dúvidas quanto à fiabilidade dos números publicados por essa Europa fora sobre esta terrível catástrofe, esta Pandemia veio relevar a necessidade de que temos TODOS de repensar o funcionamento das Respostas Sociais, em particular as ERPI´s, fundamentalmente o Estado como entidade de tutela da área social.

O Setor Social, também denominado por Terceiro Setor, que engloba as IPSS (Associações e Fundações), as Cooperativas, as Mutualidades e as Misericórdias, tem vindo a substituir o Estado na Intervenção Social e tem-se afirmado como uma área fundamental na Economia Nacional, no desenvolvimento social e económico, na intervenção, inclusão social e no emprego.

Pena é que nos dias que correm, se discuta a sua importância, normalmente em confronto com os defensores da inclusão destas atividades no Setor Público ou no Setor Privado, quando o problema fundamental deve passar pela organização e funcionamento da Intervenção, Regulação, dos Direitos Humanos, da Cidadania e da Qualidade de Vida das pessoas que são atendidas, tal como se revelou fundamental nesta Pandemia.

O que se tem passado nos ERPI´s nesta fase Pandémica, é resultado da falta de discussão sobre as MUDANÇAS que devem ser implementadas nestas áreas, para não falar dos Investimentos necessários para as concretizar, por exemplo nos Lares de Idosos.

Não é possível pensar hoje a intervenção nestas Respostas Sociais nos mesmos moldes de há 20/30 anos atrás, em que o atendimento era feito a pessoas que apenas necessitavam de atenção social e de vigilância na saúde, na organização da gestão da sua vida diária, na administração da medicação, no acompanhamento e na ocupação.


O que se tem passado nos ERPI´s nesta fase Pandémica, é resultado da falta de discussão sobre as MUDANÇAS que devem ser implementadas


Hoje, a questões de saúde e da qualidade de vida destas pessoas são aspetos tão ou mais importantes que os atrás referidos.

Aliás, a maioria dos Idosos hoje internados nestes Equipamentos Sociais têm muitas morbilidades, como por exemplo demências, que exigem uma intervenção na área da saúde mais profissional, consistente e permanente, com a intervenção de profissionais (médicos e enfermeiros), equipamentos mais ajustados à intervenção e condições do edificado diferentes.

Apenas a forma de intervir justifica uma alteração de fundo – MUDANÇA – de modo a otimizar todo o trabalho nesta área social.

O Terceiro Setor ou a Economia Social é desenvolvida por uma multiplicidade de organizações de pessoas, procurando a intervenção de forma sustentável, sem o objetivo da obtenção de lucro. Obviamente apuram-se resultados, maiores ou menores, positivos ou negativos, consoante a tipologia de organização e a sua forma de gestão. Contudo, se eles forem positivos, eles são incorporados na Instituição, nas áreas de Investigação, Formação dos Recursos Humanos ou no Investimento Social.

Daí considerar que estas organizações são as que se encontram melhor capacitadas para desenvolver as atividades de apoio social a Crianças, Jovens e Adultos, senão vejamos:

1) O Terceiro Setor ou Economia Social ou Solidária está presente em todas as atividades económicas desde a agricultura aos serviços;

2) Pela sua natureza gera, além de outros, importantes contributos na Coesão Social, importante participação cívica, pertencem às pessoas e servem as pessoas, desenvolvimento económico e Inovação Social;

3) Na Europa dos 27 – O Continente da Solidariedade – o Terceiro Setor tem mais de 2 milhões de empresas que empregam cerca de 15 milhões de pessoas, cerca de 6,5 % do emprego total, número muito importante;

4) Em Portugal, de acordo com a Conta Satélite da Economia Social, em 2013 existiam 61 mil Organizações do Setor Social, que empregavam cerca de 216 mil pessoas, cerca de 6 % do emprego total e representam cerca de 3 % Valor Acrescentado Bruto Nacional;

5) São instituições disseminadas por todo território europeu (também em Portugal), preferencialmente locais e mais próximas das pessoas estando profundamente enraizadas nas comunidades;

6) Contribuem e continuam a contribuir para a melhoria da Qualidade de Vida das Pessoas que atendem e para o aumento da longevidade.

O aparecimento dos graves problemas que ocorreram nas ERPI´s, resultam em parte, dos elevados custos de funcionamento inerentes ao desenvolvimento das suas atividades, não compensados com receitas, asfixiando as Instituições, privando-as de poder investir nas respetivas infraestruturas, na segurança, na digitalização, na Qualidade dos seus serviços, na melhoria da qualidade dos serviços e modernização.

Face a tudo isto, podemos ainda colocar a questão de uma outra forma, que é o facto de esta situação poder conduzir à insustentabilidade das Instituições ou penalizar um dos seus fins mais importantes, consignados nos seus Estatutos, que é a do apoio aos mais carenciados.

O que eu não gostaria de ver no futuro.

Por Domingos Rosa – Presidente da Fundação AFID Diferença


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