Autor: Pedro Aragão Morais
CRIANÇAS E JOVENS EM RISCO DE EXCLUSÃO
INTRODUÇÃO
A sinalização das situações que ponham em risco a vida, a integridade física ou psíquica da criança, constitui uma obrigação para qualquer pessoa. A comunicação pode ser dirigida às entidades com competência em matéria de infância e juventude (serviços de saúde, escolas, serviços de acção social, etc.), às entidades policiais (PSP ou GNR), às CPCJ’s ou às autoridades judiciárias (Ministério Público e tribunais). O Programa Escolhas, gerido pelo Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural – ACIDI, IP, tem por missão promover a inclusão social de crianças e jovens de contextos socioeconómicos vulneráveis, visando a igualdade de oportunidades e o reforço da coesão social. Desde 2007, as crianças apresentam-se como o grupo etário com maior vulnerabilidade à pobreza.
ÂMBITO
O público-alvo deste segmento são crianças e jovens (até aos 18 anos) em contexto familiar muito carenciado e/ou desestruturado, abandonadas, expostas a comportamentos comprometedores do seu bem-estar e desenvolvimento, alvo de negligência e/ou de maus-tratos (físicos ou psicológicos), na iminência de se colocar em causa o seu Direito à Educação (p.e. exploração trabalho infantil) e ainda crianças e jovens que assumam comportamentos graves (antissociais e de indisciplina). Considera-se que a criança ou o jovem está em perigo quando se encontra numa das seguintes situações:
• Está abandonada ou vive entregue a si
própria;
• Sofre maus-tratos físicos ou psíquicos ou é
vítima de abusos sexuais;
• Não recebe os cuidados ou a afeição
adequados à sua idade e situação pessoal;
• É obrigada a actividade ou trabalhos
excessivos ou inadequados à sua idade,
dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à
sua formação ou desenvolvimento;
• Está sujeita, de forma directa ou indirecta, a
comportamentos que afectem gravemente a
sua segurança ou o seu equilíbrio emocional;
• Assume comportamentos ou se entrega
a actividades ou consumos que afectem
gravemente a sua saúde, segurança, formação,
educação ou desenvolvimento sem que os pais,
o representante legal ou quem tenha a guarda
de facto, lhes oponham de modo adequado a
remover essa situação.
O conceito de risco de ocorrência de maus-tratos em crianças é mais amplo e abrangente do que o das situações de perigo, tipificadas na Lei, podendo ser difícil a demarcação entre ambas. As situações de risco implicam um perigo potencial para a concretização dos direitos da criança, e.g.: as situações de pobreza, embora não atingindo o elevado grau de probabilidade de ocorrência que o conceito legal de perigo encerra. A manutenção ou a agudização dos factores de risco poderão, em determinadas circunstâncias, conduzir a situações de perigo, na ausência de factores de protecção ou compensatórios.
Nas situações de risco, a intervenção circunscreve-se aos esforços para superação do mesmo, através de políticas, estratégias e acções integradas, numa perspectiva de prevenção primária e secundária, dirigidas à população em geral ou a grupos específicos de famílias e crianças em situação de vulnerabilidade. e.g.: campanhas de informação e prevenção; acções promotoras de bem-estar social; projectos de formação parental; respostas de apoio à família, à criança e ao jovem, RSI, prestações sociais, habitação social, alargamento da rede pré-escolar.
Nas situações de perigo, a intervenção visa remover a condição em que a criança se encontra, nomeadamente pela aplicação de uma medida de promoção e protecção, bem como promover a prevenção de recidivas e a reparação e superação das consequências dessas situações.
Situações frequentes:
• Exposição a comportamentos
comprometedores do bem-estar e
desenvolvimento - violência doméstica;
consumo de álcool e estupefacientes
• Negligência - Falta de supervisão/
acompanhamento familiar; Ao nível da saúde;
Ao nível educativo; Ao nível psicoafectivo
• Em causa Direito à Educação - absentismo
escolar; abandono escolar
• Criança/Jovem assume comportamentos
graves - anti-sociais e de indisciplina;
consumo de drogas; bullying
RESPOSTAS
As Comissões de Protecção de Crianças eJovens (CPCJ) são instituições oficiais, não judiciárias, com autonomia funcional, que visam promover os direitos da criança e do jovem e prevenir ou pôr termo a situações susceptíveis de afectar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral.
O Ministério Público assegura as funções estatutárias de controlo da legalidade e de defensor dos interesses das crianças e jovens em perigo, devendo para o efeito, acompanhar as atividades das CPCJ’s e apreciar a legalidade e mérito das suas deliberações, suscitando, quando entender necessário, a sua apreciação judicial.
A promoção dos direitos e a protecção da criança e do jovem em risco compete, subsidiariamente, a todas as entidades públicas e privadas com atribuições em matéria de infância e juventude.
A sinalização (comunicação) das situações que ponham em risco a vida, a integridade física ou psíquica da criança, constitui uma obrigação para qualquer pessoa. A comunicação pode ser dirigida às entidades com competência em matéria de infância e juventude (serviços de saúde, escolas, serviços de ação social, etc.), às entidades policiais (PSP ou GNR), às CPCJ’s ou as autoridades judiciárias (Ministério Público e tribunais). Principais entidades sinalizadoras: estabelecimentos de ensino; autoridade policial; pais e familiares.
No âmbito da protecção das crianças e jovens em risco, toda a intervenção deve procurar ser concertada com entidades governamentais e não-governamentais, com competência em matéria de infância e juventude, de modo a respeitar e reforçar estratégias de cooperação e racionalização de recursos.
Tais intervenções podem assumir âmbitos, intervenientes e contornos distintos, designadamente:
• Medidas de acolhimento familiar;
• Medidas de acolhimento institucional;
• Encaminhamento para adopção;
• Medidas de apoio para a autonomia de vida;
• Medidas de apoio junto de pais e familiares;
• Medidas de apoio junto dos estabelecimentos
de ensino;
• Encaminhamento para serviços de saúde;
• Processo judicial.
No âmbito da Acção Social, as respostas convencionadas para crianças e jovens são as seguintes:
• Intervenção Precoce - Resposta que visa
garantir condições de desenvolvimento
das crianças com alterações nas funções
ou estruturas do corpo que limitam o
crescimento pessoal e social e a sua
participação nas atividades típicas para a
idade, bem como das crianças com risco grave
de atraso de desenvolvimento.
• Ama - Actividade desenvolvida por pessoa
capacitada que, por conta própria e mediante
retribuição, cuida de uma ou mais crianças até
aos 3 anos de idade que não sejam
suas parentes, por um período de tempo
correspondente ao trabalho ou impedimento
dos pais ou da pessoa que tenha a guarda de
facto.
• Creche - Resposta social de natureza
sócio educativa, para acolher crianças até aos 3
anos de idade, durante o período de
impedimento dos pais ou da pessoa que tenha a
sua guarda de facto.
• Estabelecimento de Educação Pré-escolar -
Resposta social orientada para
o desenvolvimento de crianças com idades
compreendidas entre os 3 anos e a idade de
ingresso no ensino básico, proporcionando-lhes
actividades educativas e actividades de apoio à
família.
• Centro de Actividades de Tempos
Livres - Resposta social que proporciona
actividades de lazer a crianças e jovens a partir
dos 6 anos, nos períodos disponíveis das
responsabilidades escolares, desenvolvendose
através de diferentes modelos de
intervenção, nomeadamente acompanhamento,
prática de actividades específicas e
multiactividades.
BOAS PRÁTICAS
O Programa Escolhas, gerido pelo AltoComissariado para a Imigração e DiálogoIntercultural – ACIDI, IP, tem por missão promover a inclusão social de crianças e jovens de contextos socioeconómicos vulneráveis, visando a igualdade de oportunidades e o reforço da coesão social. Este programa, de âmbito nacional, é financiado pelo Instituto da Segurança Social, pela Direcção Geral de Educação e pelo Fundo Social Europeu. A funcionar desde 2001, actualmente o Programa Escolhas já vai na sua 6ª Geração. Até à edição anterior, concluída em Dezembro de 2015, este programa manteve protocolos com os consórcios de 110 projectos locais de inclusão social em comunidades vulneráveis, muitos dos quais localizados em territórios onde se concentram descendentes de imigrantes e minorias étnicas.
O Programa Escolhas está estruturado nas seguintes medidas:
• Inclusão escolar e educação não formal;
• Formação profissional e empregabilidade;
• Participação cívica e comunitária;
• Inclusão digital;
• Empreendedorismo e capacitação.
Até à sua 4ª Geração, os impactos globais do
Programa Escolhas eram os seguintes:
• 89.232 participantes;
• 759.819 sessões de trabalho;
• 9.776 reintegrações em escola, formação
e emprego de jovens anteriormente
desocupados;
• 86,7% de sucesso escolar global no ano lectivo
2011/2012;
• 13.949 certificações no domínio das TIC;
• 87% do financiamento dirigido aos projectos;
• Custo per-capita diário de 0,42€.
No quadro abaixo apresentamos alguns projectos que estão a ser apoiados pelo Programa Escolhas – 6ª geração:
PROJETO | PROMOTOR |
Apelarte | Agrupamento de
Escolas da Apelação |
Cumplicidades | Rumo, Cooperativa de
Solidariedade Social |
ORIENTA.TE | Tese |
TASSE | Fundação Santa
Rafaela Maria |
2BRAVE | Pressley Ridge |
Cresce e Aparece | Terras Dentro |
Pescador de Sonhos | APEXA |
Cercar-te | Espaço T |
Geração Tecla | Cruz Vermelha
Portuguesa - Delegação
de Braga |
Renascer | Misericórdia de Ponta
Delgada |
O Programa Cidadania Activa, financiado pelo
EEA Grants e em Portugal gerido pela Fundação
Gulbenkian, no seu domínio de actuação D, visa
apoiar a empregabilidade e a inclusão dos jovens.
Neste domínio, em concreto, as intervenções
apoiadas devem cumprir uma ou mais das
seguintes finalidades:
• Capacitação para a empregabilidade,
com prioridade aos jovens em situação de
vulnerabilidade, incluindo o desenvolvimento
de soft skills e a aquisição de competências
para o mundo do trabalho;
• Empreendedorismo e criação de emprego,
com prioridade aos jovens em situação
de vulnerabilidade, incluindo formação e
acompanhamento de novos empreendedores;
• Inclusão social de crianças, adolescentes e
jovens em situação de vulnerabilidade.
Alguns exemplos de projectos apoiados pelo EEA Grants nestes três subdomínios:
Projecto:
Capacitação “4 job”
Promotor: Serviço Jesuíta aos Refugiados
Parceiros: Agrupamento de Escolas Pintor
Almada Negreiros, João Líbano Monteiro &
Associados, S.A. e Jerónimo Martins SGPS, SA
Sinopse: Visa desenvolver actividades de
valorização pessoal, e seguidamente, estreitar
relações entre jovens e potenciais empregadores,
culminando com a efectiva integração no mercado
de trabalho. Integrarão o projecto 45 jovens
migrantes em situação vulnerável, muitos dos
quais à procura de 1.º emprego. Devidamente
acompanhados, e cada um seguindo um Plano
Individual de Intervenção, estes jovens vulneráveis
e em risco de exclusão aperfeiçoarão as suas “soft
skills” de forma a estarem melhor preparados para
o mercado de trabalho, realizarão estágios não
remunerados em empresas, e subsequentemente
serão integrados no mercado de trabalho.
Apoio: 108.282€
Projecto:REDECOOL Emprego
Promotor: Animar – Associação Portuguesa para
o Desenvolvimento Local
Parceiros: Cooperativa António Sérgio para a
Economia Social
Sinopse: As medidas nacionais e locais de
apoio ao emprego não tomarem em consideração
o contexto distintivo destes jovens, que irão
beneficiar, no âmbito deste projecto, de
acompanhamento de proximidade que permitirá
abordar as várias dimensões (social, psicológica,
familiar, económica, escolar) dos seus problemas.
Serão, nomeadamente, criadas e dinamizadas 7 Redes Colaborativas para o Emprego Local Jovem
em diferentes pontos do país, através das quais
se procurará o envolvimento destes jovens para o
desenvolvimento das suas competências e a sua
integração no mercado de trabalho. O promotor irá
contar com a colaboração de 7 organizações locais
com experiência de trabalho com o desemprego
local.
Apoio: 118.363€
Projecto:
IDEARIA
Promotor: CooLabora, CRL
Parceiros: GICC – Teatro das Beiras, Município
da Covilhã e Universidade da Beira Interior
Sinopse: Tem como objetivo o desenvolvimento
de competências sociais dos jovens através da sua
participação em actividades experimentais que
combinam arte, inovação e empreendedorismo
social. Os resultados esperados incluem o
desenvolvimento de competências sociais através
de oficinas artísticas e itinerários de formação, a
promoção do empreendedorismo, disponibilizando
uma plataforma para a experimentação e para a
orientação de apoio às ideias empreendedoras;
e através da criação de um manual de
empreendedorismo social e um guia de boas
práticas para o emprego jovem.
Apoio: 104.704€
Projecto: JAM – Jovens, Arte e Movimento
Promotor: Associação Par – Respostas Sociais
Parceiros: One Beat Filts All – EKA Unity, Escola
Digital Rumos e Direcção Geral da Reinserção e
Serviços Prisionais
Sinopse: O projecto destina-se a jovens em
situação de risco em centros de acolhimento e a
jovens institucionalizados em centros educativos.
Vai promover o desenvolvimento pessoal e social
com recurso à arte, trabalhando em conjunto
componentes psicossociais e artísticas, e favorecer
a integração socioprofissional.
Apoio: 115.144€
INDICADORES
A taxa de pobreza das crianças e dos jovens
aumentou de 22,4% em 2009 para 25,6% em 2013.
Desde 2007, as crianças apresentam-se como o
grupo etário com maior vulnerabilidade à pobreza
e desde 2003 que a taxa de risco de pobreza junto
das crianças permanece superior a 20%.
No ano de 2014, a totalidade das CPCJ instaladas a nível nacional, acompanharam 73.019 processos, dos quais arquivaram 37.422, permanecendo activos 35.597 processos que transitaram para 2015. Nesse mesmo ano de 2014, foram instaurados pelas CPCJ um total de 30.356 processos de promoção e protecção.
As principais entidades sinalizadoras foram os Estabelecimentos de Ensino (5.480), a Autoridade Policial (3.551), a Família - pai, mãe ou outro (1.252), as CPCJ (1.096), os Estabelecimentos de Saúde (1.042) e o Ministério Público (935). Com valores percentuais inferiores, registe-se ainda os Serviços da Segurança Social, as IPSS e as Autarquias.
As situações de perigo sinalizadas às Comissões de Protecção incidem, maioritariamente, em cinco problemáticas: exposição a modelos de comportamento que possam comprometer o bemestar da criança 25,4% (3.598); situações de perigo em que esteja em causa o direito à educação 22,2% (3.147), negligência 20,7% (2.932); a criança assume comportamentos que afectam o seu bem-estar 13,0% (1.834) e outras situações de perigo 5,8% (738). Seguem-se por ordem decrescente: maustratos físicos 5,5% (782) e o mau trato psicológico ou indiferença afectiva 2,8% (398).
Do total das medidas aplicadas pelas CPCJ, a grande maioria, 88,5% (19.410), corresponde a medidas em meio natural de vida, enquanto as medidas de colocação representam 11,5 % (2.533). Analisando as medidas aplicadas pelas CPCJ a nível nacional, regista-se que a medida mais aplicada foi o apoio junto dos pais (74,7%). Seguem-se, por ordem decrescente, o apoio junto de outros familiares (11,3,%), o acolhimento institucional (10,9%), a confiança a pessoa idónea (1,8%), o apoio para a autonomia de vida (0,7%) e o acolhimento familiar (0,6%).
LEGISLAÇÃO
• Declaração dos Direitos da Criança, adoptada
pela Assembleia - Geral das Nações Unidas em
20 de Novembro de 1959
• Convenção dos Direitos da Criança aprovada
pela O.N.U. em 1989 e ratificada por Portugal
em 12/09/90
• Decreto-Lei nº 98/98, de 18 de Abril - Cria a
Comissão Nacional de Protecção das Crianças e
Jovens em Risco (CNPCJR), na dependência dos
Ministros da Justiça e da Solidariedade e
Segurança Social
• Lei nº 147/99 de 1 Setembro: Lei de protecção
de crianças e jovens em perigo
• Decreto-Lei n.º 159/2015 de 10 agosto - Criação
da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos
e Protecção das Crianças e Jovens e define as
respectivas missão, atribuições, tipo de
organização interna e funcionamento.