No seguimento do convite que foi dirigido pelo SECTOR 3, que muito honra as instituições das quais sou um dos responsáveis — Comunidade Vida e Paz e Centro Social Paroquial de Nossa Senhora da Luz —, vou limitar-me a partilhar experiências e sentimentos, tentando traduzi-los em reflexões, relacionados com o tema "Liderança em Economia Social", com que fui desafiado. Para isso vou utilizar a minha experiência como militar e como membro do clero da Diocese de Lisboa.

Recordo-me muito bem da minha recruta na Escola Prática de Infantaria de Mafra, no Curso de oficiais Milicianos, no já distante ano de 1983. Tive o privilégio de ter como comandante de companhia o Capitão Marques Júnior, um dos Capitães de Abril. Uma pessoa calma, ponderada, que inspirava confiança, que não necessitava de gritar para que todos o seguíssemos. Que diferença em relação a outra companhia, onde o capitão era conhecido pelos seus gritos e castigos físicos. Quantos o seguiriam numa batalha?

Estes dois capitães demonstram a diferença entre alguém que manda, porque tem o poder formal, e quem comanda (manda-com). Sendo um conceito militar tem os seus sinónimos na sociedade civil entre quem lidera e quem manda. Esta experiência marcou claramente a minha forma de relação com as pessoas que do ponto de vista formal, estão à minha responsabilidade. Este conceito não é novo, já Sun Tzu um general chinês que viveu há mais de 2.500 anos atrás, possivelmente durante o século 6 a.C. e nos deixou um verdadeiro tratado inspirador de como ser líder nos diz que “Um líder lidera pelo exemplo, não pela força” e que devem “ Tratar os seus homens como filhos e eles o seguirão aos vales mais escuros. Trate-os como filhos queridos e eles o defenderão com a própria morte “. Sinteticamente o líder conquista o coração daqueles que lidera.

“Um líder lidera pelo exemplo, não pela força”

Já a minha experiência como Diácono, assenta na missão para o serviço, partindo da consciência de que somos “inúteis servos”, ou seja a nossa ação não decorre de nós, mas sim de Nosso Senhor Jesus Cristo. Jesus, que no episódio do lava-pés quebra todos os conceitos sociais e religiosos. Não resisto a partilhar um extrato de um texto referente a essa cena primordial do Cristianismo

“Fez-se um silêncio repentino na sala, só interrompido por um protesto de um deles que dizia com forte sotaque galileu:

- Mestre! Tu lavares-me os pés a Mim?

Fiquei perplexo: Mestre? Era então o famoso Jesus aquele homem que tinha cingido a toalha? Era então verdade o que tinha ouvido comentar que Ele dizia: No Meu Reino o mais importante é o que serve, e os grandes são os que se fazem servidores dos outros?”

Na síntese destes dois ensinamentos, partilho algumas reflexões sobre o que considero serem algumas das qualidades do líder, que gostava de aplicar na sua totalidade, mas claramente não o consigo.

Ser Exemplo

O Líder é o que faz, que dá o exemplo, é o primeiro, porque é desta forma que ganha a confiança e o respeito dos seus subordinados, depois deve ensinar e coordenar, líder não é o “faz tudo”, é quem dá o exemplo, pensa, incentiva e coordena.

Ter Visão Estratégica

O Líder pensa a organização a curto, médio e longo prazo. Sabe o que quer, tem uma cronologia dos objetivos a atingir e as suas decisões estão sustentadas nesse pensamento. O Líder não gere o dia a dia conforme as circunstâncias mais ou menos agradáveis, mas sim focado na estratégia pensada e implementada.

Ser Justo e Assertivo

O Líder trata as pessoas com justiça. Tratar as pessoas com justiça não é tratar todas as pessoas da mesma forma, mas sim conforme a necessidade de cada uma. Implica conhecer os subordinados, a mundivisão de cada um deles, as suas capacidades e angústias. Saber conciliar feitios muitas vezes conflituantes, retirando as melhores capacidades de cada um em prol do bem da organização. Implica também conseguir trabalhar com pessoas com as quais não se sente empatia. Por exemplo, conseguir que as decisões dentro da direção sejam consensuais, implica um trabalho de conciliação entre os diferentes membros, cada um deles com diferentes sensibilidades, trabalho esse muitas vezes realizado anteriormente.

Ser Humilde

O Líder deve assumir-se como uma pessoa Humilde, aceitando a critica construtiva e o desacordo da sua equipa de assessores, com a consciência de que corrigir uma decisão não é um fracasso, mas um ato de coragem. É o assumir-se como “Inútil Servo”, ao serviço de um bem maior.

corrigir uma decisão não é um fracasso, mas um ato de coragem

Ser Corajoso na Decisão

O Líder deve saber rodear-se de pessoas competentes e de confiança, de forma a receber os melhores contributos para a tomada da melhor decisão. No entanto o líder sabe que apesar dos contributos recebidos, geralmente, as decisões, especialmente as mais difíceis, são decisões solitárias. O líder assume as decisões mais duras e difíceis, por exemplo em caso de despedimento, é ele a comunicar cara a cara essa decisão. Por experiência própria é algo que faço sempre muito desconfortavelmente, por outro lado, as decisões mais “simpáticas” deve deixar aos seus subordinados mais diretos.

Ter Capacidade de Escuta

Ouvir as pessoas que dele dependem, suas preocupações e angústias, é uma qualidade fundamental no líder, mas geralmente devido às muitas solicitações a que é chamado é difícil de praticar. Implica grande vontade e discernimento do líder, pois é fundamental para “conquistar” as pessoas que dele dependem, que assim o sentem mais próximo e preocupado com o seu bem estar.

Saber Elogiar

Elogiar, de forma verdadeira, implica conhecer a pessoa que se quer elogiar, as suas capacidades e dificuldades. Elogiar uma pessoa que tem naturais dificuldades na sua função, que se esforça por melhorar, implica estar atento e desta forma reforçar a sua autoestima, mesmo que o seu desempenho seja geralmente abaixo dos colegas. Naturalmente também deve elogiar os colaboradores com bom desempenho, mas estar atento a quem tem naturais dificuldades é uma das características do líder.

estar atento a quem tem naturais dificuldades é uma das características do líder

Privilegiar a Inovação e a Mudança

O Líder não tem medo da mudança e incentiva a inovação. Não se esconde na comodidade do “sempre se fez assim.…”. Tem sido com imensa satisfação que “contaminei” a minha equipa e conseguimos diversos prémios BPI, Altice, Missão Sorriso, .... Prémios esses que assentam num olhar atento das dinâmicas sociais, de acolher propostas dos colaboradores, de novas formas de trabalhar e de responder às necessidades das pessoas.

Em síntese o líder conquista as pessoas que lidera, sendo, com humildade, mais um e o primeiro da equipa, não se colocando acima da mesma.

Por Horácio Félix, presidente da direção na Comunidade Vida e Paz