A PROBLEMÁTICA DA SUSTENTABILIDADE NAS ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SECTOR

Autor: José Manuel F. C Antelo

A PROBLEMÁTICA DA SUSTENTABILIDADE NAS ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SECTOR

“Não temos nas nossas mãos as soluções para todos os problemas do Mundo,

mas diante de todos os problemas do Mundo temos as nossas mãos”

Johann Cristoph Friederich von Schiller

*Marbach am Neckar

– Nov, 10, 1759 +Weimar – Mai, 9, 180 1 –


INTRODUÇÃO

No seguimento do convite que foi dirigido pelo SECTOR 3, que agradeço, a seguir se apresentam algumas reflexões sobre a área escolhida, as quais poderão servir como ponto de partida para se prosseguir um diálogo sobre tão importante tema, com vantagens para todos os intervenientes que quiserem vir a colaborar, bem como para todos aqueles que apenas desejem dele tomar conhecimento.


DEFINIÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO TEMA

É habitual representar-se a “sustentabilidade” com um diagrama formado por círculos cada vez mais abrangentes, a iniciar com a Economia, seguido da Sociedade e a terminar no Ambiente.

No entanto, tendo em conta o tema escolhido – Sustentabilidade das Organizações do Terceiro Sector – será talvez preferível construir uma outra imagem, a qual não contradiz a primeira, mas a representa sob outra perspetiva, constituída por uma base de três pilares, sobre os quais se constrói a Organização.

O primeiro pilar, representativo da área económico-finaceira, na qual se englobam todos os ativos e passivos, direitos e obrigações da instituição.

O segundo pilar, representativo da área dos recursos humanos, quer em sentido restrito - utentes, familiares, membros dos órgãos sociais, técnicos, funcionários, voluntários - quer em sentido lato -fornecedores, prestadores de serviços, comunidade envolvente.

O terceiro pilar representa a área dos valores. Nele estão incluídos desde a Constituição do país e da legislação aplicável até aos estatutos, normas e regulamentos da instituição, bem como os princípios éticos que lhes são inerentes, onde também se incluem os cuidados com a preservação ambiental.

É sobre estes três pilares que qualquer organização se sustenta, e se um deles apenas colapsar é toda a instituição que entra em perda de sustentabilidade no verdadeiro sentido do seu étimo latino - sustentare ou sustinere – consoante o autor escolhido, Vergílio ou Cícero.

Em todos os casos, a noção de sustentabilidade “parte das pessoas envolvidas” (Walls e Schwarzin -2009), “deve gerar inovações organizacionais” (Nidumolu et al -2009) e é também “uma abordagem de negócios que considera de forma equilibrada e holística os aspetos económicos, sociais e ambientais” (Lange et al -2012).

Assim sendo, este tema justifica-se na medida em que:

- As IPSS, como Organizações do Terceiro Sector, representam no nosso país uma força insubstituível, dado estarem disseminadas por toda a sociedade, com relações de proximidade, com funções supletivas do Estado onde este, pela sua dimensão e especificidade, não pode e não deve estar presente, embora não possa e não deva alienar as suas responsabilidades.

- Em estudos recentes (por exemplo “As Instituições Particulares de Solidariedade Social em contexto de crise económica” – CNIS, Fundação Millennium BCP, Banco de Portugal – 2016 – POISE.03-4639- FSE- 000007) são patentes as debilidades destas organizações, debilidades essas que podem vir a ser rapidamente agravadas pela atual crise pandémica e crise social que já lhe sucede e irá perdurar por largo período de tempo.

Torna-se, portanto, pertinente alertar tais instituições, tanto para o seu interior como para o seu exterior, da necessidade imperiosa da Criação de Valor, da Inovação e, antes de tudo, na deteção em tempo útil das suas fragilidades por forma a ser possível estabelecer um Programa de Transformação coerente, eficaz e em tempo útil.


OBJETIVOS

O presente artigo tem por finalidade apresentar uma metodologia, dentre várias possíveis, para deteção de eventuais problemas económico-financeiros a tempo de inverter ou corrigir o rumo antes da instituição em causa se encontrar em situação de incumprimento a curto, médio ou, pior ainda, a longo prazo. Se tal viesse a suceder poderia levar à sua extinção com os prejuízos inerentes para com a população a quem são prestados serviços e aos seus familiares, população normalmente muito frágil, indefesa e muitas vezes sem alternativas.

De notar que as instituições do Terceiro Sector não visam a obtenção de lucro para remunerar o capital investido pelos acionistas (que não existem), mas que a obtenção de resultados positivos anuais é necessária para investir na inovação, desenvolvimento e progresso, pois que resultados sistematicamente negativos levam, mais tarde ou mais cedo, à sua extinção.

Por isso, a análise das contas plurianuais, a determinação de rácios e indicadores que alertem para o rumo que está a ser seguido, são tão ou mais importantes que o registo puro e simples de resultados históricos, embora estes sejam necessários para se calcularem aqueles.

(Ver Anexo I)


METODOLOGIA

Uma metodologia simples que se propõe seguir é a de analisar as principais áreas para a Criação de Valor. Por uma questão de simplicidade a seguir se apresenta de forma esquemática uma árvore de Criação de Valor, a qual, na maioria dos casos, pode ser adotada no estudo, caso a caso, das instituições, mas que poderá e deverá ser ajustada e adaptada em a cada caso concreto.

A Criação de Valor tanto pode ser obtida pelo aumento da receita como da diminuição de custos, aumento da eficiência dos ativos ou pela racionalização das estruturas organizacionais.

E por sua vez, cada uma destas áreas pode ser subdividida em diversos subsetores, muitos deles suscetíveis de acrescentarem valor à Instituição.

No quando abaixo se apresenta uma árvore de Criação de Valor tipo, a qual irá ser utilizada na sequência deste Artigo.

Árvore de Criação de Valor 



IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE MUDANÇA

A partir da Árvore de Criação de Valor, deverá ter lugar a inventariação das medias possíveis que podem vir a ser implementadas, qual a fonte em que se baseia a escolha efetuada, que ações haverá que empreender, qual a complexidade para a sua implementação e quais os benefícios e o impacto esperados.

Todo este levantamento deve ser efetuado sob a supervisão duma Equipa de Projeto, a qual deve basear as suas escolhas em factos objetivos, servindo-se da recolha e análise de dados e de opiniões as mais diversas, quer internas quer externas.

É da maior utilidade prática que o resultado das pesquizas efetuadas fique condensado num quadro do tipo do que a seguir se apresenta e que servirá para a criação duma Matriz de Oportunidades.


Mas a simples enumeração das medidas não tem valor em si mesmo se não forem avaliadas uma a uma, por exemplo através duma Matriz de Oportunidades, matriz essa onde num dos eixos se quantifiquem os Benefícios Esperados e no outro eixo, ortogonal ao primeiro, se quantifiquem as Oportunidades de Implementação.

A Matriz que abaixo se apresenta, foi dividida em quatro quadrantes e permite localizar e visualizar nas suas quatro áreas as oportunidades respetivas, conforme se assinalam na matriz:

- Oportunidades de Curto Prazo

- Oportunidades a Avaliar Caso a Caso

- Oportunidades a Não Investir

- Oportunidades de Médio e Longo Prazo


Para implementar as medidas que vierem a ser selecionadas e aprovadas, não basta ficar por esta fase, na medida em que se torna necessário:

- Nomear uma Equipa de Implementação do Programa (a qual pode ser total ou parcialmente constituída pela Equipa de Projeto)

- Estabelecer um programa calendarizado

- Alocar os meios materiais, humanos e financeiros adequados

- Monitorizar a implementação do Programa

- Após a conclusão da implementação do Programa (recomenda-se cerca de seis meses), deverá ser avaliado o impacto real das medidas e proceder aos ajustes que forem considerados necessários.


LIMITAÇÕES

Existem obviamente algumas limitações num simples artigo, as quais não desaparecem quando se trata do estudo particular de determinada instituição.

De entre as limitações, as principais dificuldades são as seguintes:

- Obtenção de dados fidedignos, pois sem dados rigorosos as conclusões não poderão ser validadas.

- Acesso a dados plurianuais registados segundo os mesmos critérios. Sem dados plurianuais comparáveis não se podem conhecer as tendências e as taxas de variação (tendência crescente, decrescente ou estacionária).

- Constituição duma Equipa de Projeto para implementar um Programa de mudança, na medida em que se torna necessária uma equipa multidisciplinar que envolva as diferentes áreas da instituição. Por isso a escolha do Chefe de Projeto de Mudança” terá que possuir características de líder, e não apenas capacidade de gestão.

- Existências de resistências internas e externas às mudanças de paradigma.


CONCLUSÕES

As principais conclusões que se podem tirar resumem-se a um pequeno conjunto de frases cujo conteúdo, de cada uma de per si, é já todo um programa:

- Inovar, inovar, inovar – sem inovação não há progresso e sem progresso não há futuro

- Certificação de qualidade – sem garantia de qualidade não há avaliação nem melhoria contínua.

- Necessidade de mobilização e empenhamento de TODAS as partes interessadas

- Necessidade de aproveitamento de todos os recursos disponíveis (os quais são sempre escassos) e de todas as potencialidades (as quais são mais do que normalmente aparentam ser)

- E finalmente, a Ética a envolver todo o Programa de Transformação, Programa que deve ser validado pela Comissão de Ética, quer a Comissão já exista na Instituição quer seja a criar de novo aproveitando a oportunidade que se depara com o Programa de Transformação.


PALAVRAS CHAVE

Sustentabilidade, IPSS, Criação de Valor, Programa de Transformação, Ética Institucional


ALGUMAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BANCO DE PORTUGAL- Quadros de Setor e Quadros de Empresas e de Setor – Estudos da Central de Balanços do B.P. www.bportugal.pt/QS/qsweb/Desh

CNIS – Fundação Millennium BCP – Banco de Portugal – (2016) As Instituições Particulares de Solidariedade Social em contexto de crise económica- POISE 03-4639-FSE- 000007

CORREIA, S. (2014) - Qual o desempenho económico da minha empresa? – - Porto ATES – Universidade Católica do Porto

LANGE, D.E. et al. (2012) – Sustainability in Organizations. Journal of Business Ethics.

MENDES, A. et al. (2015) – Organizações da Economia Social – O que as distingue e como podem ser sustentáveis – Porto ATES – Universidade Católica do Porto

MENEZES, J. W. (2010) – Liderança e Gestão nas Organizações Sem Fins Lucrativos. O desafio da inovação social – Porto – Impulso Positivo

SILVIA, S. et al. (2014) – Sustentabilidade das Instituições Particulares de Solidariedade Social em Portugal - 978-989-20-5004 de 22-12-2014

VEIGA, V (2020) – Sustentabilidade Económico-Financeira das IPSS – Paralisia Cerebral - Dissertação de mestrado na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia- Instituto de Serviço Social – Lisboa Solicitar acesso ao texto: virveiga@gmail.com


Por José Manuel F. C Antelo, fundador e dirigente da Associação de Paralisia Cerebral de Lisboa



Não foram encontrados comentários